”Olhe, não fique assim, não. Vai passar. Eu sei que dói. É horrível. Eu
sei que parece que você não vai aguentar, mas aguenta. Sei que parece
que vai explodir, mas não explode. Sei que dá vontade de abrir um zíper
nas costas e sair do corpo, porque dentro da gente, nesse momento, não é
um bom lugar para se estar. Dor é assim mesmo; arde, depois passa. Que
bom. Aliás, a vida é assim; arde, depois passa. Que pena. A gente acha
que não vai aguentar, mas aguenta; as dores da vida. Pense assim: agora
está insuportável, agora você queria abrir o zíper, sair do corpo,
encarnar numa samambaia, virar um paralelepípedo ou qualquer coisa
inanimada, anestesiada, silenciosa. Mas agora já passou. Agora já é dez
segundos depois da frase passada. Sua dor já é dez segundos menor do que
duas linhas atrás. Você acha que não, porque esperar a dor passar é
como olhar um transatlântico no horizonte, estando na praia. Ele parece
parado, mas aí você desvia o olho, toma um picolé, lê uma revista, dá um
pulo no mar e, quando vai ver, o barco já tá lá longe. A sua dor agora,
essa fogueira na sua barriga, essa sensação de que pegaram sua traquéia
e seu estômago e torceram como uma toalha molhada, isso tudo - é
difícil de acreditar, eu sei - vai virar só uma memória, um pequeno
ponto negro diluído num imenso mar de memórias. Levante-se daí, vá tomar
um picolé, ler uma revista, dar um pulo no mar. Quando você for ver,
passou. Agora não dá mesmo pra ser feliz. É impossível. Mas quem disse
que a gente tem que ser feliz sempre? Isso é bobagem. É melhor viver do
que ser feliz. Porque pra viver de verdade a gente tem que quebrar a
cara. Tem que tentar e não conseguir. Achar que vai dar e ver que não
deu. Querer muito e não alcançar. Ter e perder. Tem que ter coragem de olhar no
fundo dos olhos de alguém que a gente ama e ouvir uma coisa terrível,
mas que tem que ser ouvida. A vida é incontornável. A gente perde, leva
porrada, é passado pra trás, cai. Dói, ai, eu sei como dói. Mas passa.
Tá vendo a felicidade ali na frente? Não, você não tá vendo porque tem
uma montanha de dor na sua frente. Continue andando. Você vai subir, vai
sentir frio lá em cima, cansaço. Vai querer desistir, mas não vai
desistir, porque você é forte e porque, depois do topo, a montanha
começa a diminuir e o único jeito de deixá-la pra trás é continuar
andando. Você vai ser feliz. Tá vendo essa dor que agora samba no seu
peito de salto alto agulha? Você ainda vai olhá-la no fundo dos olhos e
rir da cara dela. Juro que tô falando a verdade. Eu não minto. Vai
passar.” (Antonio Prata)
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