- quero sumir;

Se você quer saber, eu não estou bem. E não é drama. Meus pais brigavam enquanto eu terminava de me arrumar pra ir a igreja. Você sabe como eu sou, não sei me calar quando o assunto é o idiota do meu pai. Sim, eu estou nervosa. Sei que se tivesse aqui diria: você devia ficar calada, não adianta discutir com ele. Mas eu não aguentei ver ele se fazendo de vítima. E então logo soltei:

- Você não gosta de ninguém mesmo, ( joguei na cara dele uma das muitas humilhações que ele me fez) nunca na minha vida vou esquecer o que me disse aquela vez, que as suas vadias valiam mais que eu. Sempre fui uma ótima filha, nunca cheguei bêbada em casa, nunca falaram mal de mim na rua, sempre te respeitei, nunca fui de ir em festas. Suas vadias são melhores que eu?

Você acredita que ele ainda sim, disse que eram? Eu juro que tentei não me alterar, mas doeu tanto ouvir isso de novo. Mas, eu ainda tive que jogar mais coisas na cara dele. Disse que a partir de hoje ele não era mais meu pai, e que quando ele morresse eu nem no seu velório iria, e muito menos derramaria uma lágrima. Disse que quando ficasse doente numa cama queria ver que mulher cuidaria dele, porque eu não deixaria meus irmãos e minha mãe cuidar. Ele disse que não precisava da gente, que ía ser feliz, que ía embora.

São mais de dezoito anos aturando isso, sinceramente não aguento mais. Eu carrego o fardo de ser a culpada por esse casamento, que aconteceu somente por minha existência. Eu vejo minha mãe sofrer e meus irmãos também. E você sabe como isso é doloroso pra mim, você se lembra de como ele sempre foi, e eu sempre aguentei essa barra sozinha, sempre tendo que parecer forte pra ajudar minha mãe e irmãos. Mas cheguei no meu limite. Eu sempre soube que ele nunca amou a gente, que sempre achou que eramos a pedra no seu sapato, sempre quis curtir a vida com as mulherzinhas dele. Mas ele dizer novamente na minha cara que elas prestam mais que eu? Está doendo muito. Eu não consigo ser tão forte. Eu até fui a missa, mas não consegui parar de chorar um minuto. O padre disse na homilia que não há sofrimento que dure pra sempre, mas já se passaram mais de dezoito anos. Sua mãe me abraçou após a missa, e como eu precisava daquele abraço, ela me disse com aquele jeito meigo dela que sou a garota mais forte que ela já conheceu, que corro atrás dos meus sonhos, que ía ser muito feliz, eu nem consegui agradecer, as lágrimas só desceram. Eu não sei o que fazer. Eu sei que queria sumir (...)